O desencanto das vidas que o horizonte não abraça | Dai Varela

25 de novembro de 2024

O desencanto das vidas que o horizonte não abraça


A cada raiar do sol, os desterrados de Mindel estendem o querer sobre o lamento ao vazio. Há que se alimentar. Há que alimentar estas sombras que forçosamente carregam estas formas curvadas pelo peso do silêncio.

Ingénuos, pois a angústia acordou primeiro que as suas penumbras por sobre Morada. Ainda assim, seus corpos deambulantes seguem nos lembrando que também são companheiros nesta prisão de sal e mar.

Além disso, fazem parte das pessoas que já não sabem o que dizer, porque ninguém o disse por elas. Difícil de se interessar pelo ritual ensaiado daqueles que sabem menos palavras em crioulo. Repertório de pedir que as torna uma cena repetitiva. Triste a decadência desses artistas nas portas das lojas e entradas das igrejas.

Para muitos, estes são os contrariedades de mão estendida, de vidas presas na ponta do não querer do outro.

Por outro lado, há uns que tentam entender, enquanto elas apenas sentem o perder quotidiano na resposta enfadonha “um ka tem”.

Do não que já era uma incerteza, junta-se o trago amargo pela inexistência no olhar do outro. Estremecem porque sentem que diariamente se tornam imperceptíveis.
O desafio é reconheceres os que de dia buscam a beleza nas calçadas às portas de quem lamenta menos,

Bem como os que de noite enfrentam o cimento que cheira a mijo para disfarçar o falso afecto que corrói a indiferença que toca. É assim que abafam o gemido, para que o seu eco não perturbe o alheio.

Os contrariedades de mão estendida só sabem de desencantos, nos quais apenas o mais-além lhes serve de manto,

Obrigados a contemplar o horizonte que cai sobre a sombra imponente da montanha que tudo observa, turístico para quem vem, invisível para o abrigo dos olhares que ficam nesta prisão de ondas e sal.

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