Arrendar casas: entre o lucro e a afronta | Dai Varela

12 de janeiro de 2014

Arrendar casas: entre o lucro e a afronta


Em Fonte Cónego (Mindelo) um senhorio resolveu tentar envergonhar seus inquilinos e escreveu na casa arrendada o calote que diz sofrer. 

Pegou num balde de tinta e pincel e escreveu: 

"MANAZINHA E O FILHO ADERITO AINDA NÃO PAGARAM A RENDA E JÁ VÃO 90.000$00 DEZENVERGONHADOS. SAIAM DA MINHA CASA"


Como se pode notar ele já tinha escrito outra frase que entretanto fora borrada com tinta mas ele regressou de novo. 


Situações como esta acontecem um pouco por todo o país. Alguns procuram acordo fora do sistema judicial, outros tentam retirar os inquilinos à força e por fim há aqueles que recorrem aos tribunais. Para os que decidem pelo tribunal um dos maiores problemas que enfrentam é a morosidade do sistema. Quando uma pessoa entra com uma acção de despejo precisa esperar que o tribunal organize e cite o inquilino e que este responda para depois passar-se para o julgamento. Todo este processo pode demorar anos e se o inquilino resolver recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça será preciso esperar mais um par de anos até que haja resposta definitiva. Porém, todo este caminho deve ser percorrido porque a resolução destes conflitos tem que acontecer nos tribunais porque a lei só reconhece a rescisão do contrato de arrendamento quando for decretada pelo juiz.

Custos

Se este senhorio resolver entrar com o processo de despejo no tribunal pode lhe custar de 10 a 14 contos. Paga um advogado que não cobrará menos do que 50 contos e se houver julgamento acrescenta-se mais 10 contos aos seus honorários. Espera-se um ano ou mais pela audiência. Quando o juiz finalmente der a sentença de que o caloteiro deve desocupar a casa, o inquilino pode recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça. Durante todo este tempo ele continua sem pagar. Após a condenação pelo tribunal pode passar mais de dois anos até que seja executada a sentença. 

Lei desactualizada

Agora, ele deverá se preparar para a lei do inquilinato em Cabo Verde que data de 1961 quando foi publicado no “Diário do Governo”, do Ministério do Ultramar. Para se ter uma ideia de quão desactualizada ela é, transcreve-se o artigo 23º que estipula que “a renda consistirá sempre em certa soma de dinheiro em moeda portuguesa corrente na província da situação do prédio.” É certo que hoje os cerca de 51 por cento da população que pagam menos de 10 mil escudos de renda, o faz em moeda nacional, bem como os que estão no outro extremo, 4,2%, que pagam mais de 35 mil escudos mensais.

Como moramos

Em Cabo verde, segundo o Censo 2010, há 25,2% dos alojamentos ocupados por arrendamento ou sub-arrendamento. A ilha do Sal é onde se mora mais de renda (53,6%), seguido de Boa Vista (39,5%) e Praia (36,6%). Na maioria dos casos o arrendamento de casas para habitação é feito através do contrato verbal e recibos de pagamentos mensais. Porém, em termos legais, é preciso um contrato escrito para ser considerado um contrato de arrendamento. Entretanto, um dos locais onde a questão de arrendamento menos se coloca é em São Salvador do Mundo porque quase todos os habitantes (95,4%) são proprietários ou co-propritários das suas habitações, seguido de São Domingos (91,8%) e S. Lourenço dos Órgãos (98,2%).

Este e outros casos mostram que é necessário mudar a lei do inquilinato, entre outras coisinhas...


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